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Conheça os reflexos trabalhistas causados pelo novo coronavírus

Com a declaração feita pela Organização Mundial da Saúde (OMS) de pandemia, provocada pelo agente coronavírus (Covid-19), que já atinge a maior parte dos países no mundo e vem se disseminando rapidamente pelo Brasil, o Sindcomércio apresenta suas orientações para os empresários do setor terciário mineiro, principalmente no que se refere às possíveis medidas que podem ser adotadas pelos empregadores e os reflexos no contrato de trabalho.

Férias coletivas

Dispõe o art. 135 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que a concessão das férias deve ser comunicada ao empregado com antecedência de, no mínimo, 30 (trinta) dias, devendo o pagamento ser efetuado até 2 (dois) dias antes do início das férias.

Contudo, em razão da situação de excepcionalidade causada pela pandemia do coronavírus e visando a proteção da coletividade, tem-se que tal regra pode ser flexibilizada, devendo o empregador observar o prazo do pagamento antecipado das férias e do terço constitucional.

As férias coletivas podem ser concedidas a todos os empregados da empresa ou apenas a determinados setores ou filiais. Em todos os casos, deve-se comunicar previamente ao Ministério da Economia, conforme prevê o art. 139, parágrafo 2º, da CLT.

Licença remunerada

A Lei 13.979/20 prevê, como medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, o isolamento e a quarentena, dispondo o art. 3º, parágrafo 3º, que será considerada falta justificada ao trabalho o período de ausência em função de tais medidas, para fins de controle da pandemia.

Ou seja, o contrato de trabalho do empregado atingido pelo isolamento e/ou quarentena, ainda que não infectado, porém por medida de prevenção, ficará interrompido, devendo o empregado receber normalmente o salário sem a prestação do serviço.

Caso o afastamento seja superior a 30 (trinta) dias consecutivos, o empregado perde as férias proporcionais e o novo período aquisitivo se inicia quando da retomada ao serviço. Pode-se, também, haver ajuste por escrito entre empregador e empregado dispondo que o período de licenciamento, que não os previstos na referida Lei 13.979/20, servirá como compensação das horas extras laboradas anteriormente.

Outra possibilidade é a adoção da regra contida no art. 61, parágrafo 3º, da CLT, uma vez que a situação epidemiológica do coronavírus se enquadra na hipótese de força maior (art. 501 da CLT). Neste caso, o empregado interrompe a prestação de serviços, recebendo normalmente o salário durante o período. Quando retornar ao trabalho, o empregador poderá exigir, independentemente de ajuste escrito, a realização de até 2 (duas) horas extras diárias, por um período de até 45 (quarenta e cinco) dias, visando compensar o período de afastamento.

Por fim, para os empregados contratados em regime presencial de prestação de serviços, cujo labor pode ser executado a distância em regime de teletrabalho, fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação, poderá ocorrer a conversão, durante este período, do trabalho presencial em telepresencial, seja mediante ajuste bilateral e por escrito, nos moldes da legislação trabalhista (art. 75-C, parágrafo 1º, da CLT), seja unilateralmente por decisão do empregador, neste caso, por se tratar de medida emergencial e decorrente de força maior.

Norma coletiva

Mediante acordo coletivo (empresa x sindicato laboral) ou convenção coletiva de trabalho (sindicato patronal x sindicato laboral), é possível a redução do salário do empregado durante o período de afastamento decorrente das medidas preventivas e de combate à pandemia, com base no art. 7º, inciso VI, da Constituição Federal e art. 611-A da CLT.

Ademais, como a norma coletiva tem prevalência sobre a lei ordinária, podem, também, os instrumentos coletivos disciplinarem outras questões, como criar regras de compensação diversas das já previstas em lei, prevendo a possibilidade de realização de 3 (três) horas extras por dia pelo tempo necessário à completa recuperação do período de afastamento.

Enfim, considerando que o instrumento coletivo é uma forma de livre ajuste de interesses entre as partes e comporta ampla negociação, desde que o objeto negociado não seja um dos elencados no rol vedado pelo art. 611-B da CLT, cabe às partes discutirem o que é melhor para a categoria durante este período de contenção.

Aditivo ao contrato de trabalho

Outro instrumento que pode ser utilizado pelas empresas consiste na celebração de aditivos aos contratos de trabalho, permitindo uma readequação e alteração do horário de trabalho dos empregados, por um período determinado, a fim de evitar que a atividade laboral colida com os horários de pico dos transportes públicos.

A fundamentação para a referida alteração se baseia na própria declaração da OMS de pandemia global do Covid-19, enquadrando-se como motivo de força maior previsto no art. 501 da CLT.

Empregado infectado

Caso algum empregado seja diagnosticado com o novo coronavírus, ele deve se submeter às mesmas regras de afastamento das demais doenças, ou seja, o empregador continua responsável pelo pagamento do salário nos primeiros 15 (quinze) dias, assumindo posteriormente o INSS o pagamento do benefício do auxílio-doença quando do preenchimento dos requisitos.

Importante ressaltar que esse afastamento não se confunde com aquele previsto na Lei 13.979/20, destinado à prevenção (isolamento e quarentena), pois aqui se trata de afastamento por licença médica, ficando o contrato de trabalho interrompido nos 15 (quinze) primeiros dias e suspenso pelo período posterior.

Apesar de difícil comprovação, posto se tratar de uma pandemia, ou seja, uma enfermidade epidêmica de fácil e ampla disseminação, se o empregado for infectado no ambiente de trabalho, pode ser considerado acidente de trabalho atípico, enquadrando-se como doença ocupacional, nos termos dos artigos 19 e 20 da Lei 8.213/91, salvo se comprovada a hipótese contida na alínea “d”, parágrafo 1º, do art. 20 da mesma lei, que dispõe que não serão consideradas como doença do trabalho a doença endêmica adquirida por empregado habitante de região em que ela se desenvolva, exceto se comprovado de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.

Empregado suspeito

Caso haja suspeita de algum empregado contaminado, o isolamento é medida necessária a ser imediatamente tomada para evitar o contágio a outros empregados, terceiros e clientes, com as devidas precauções antecedentes, como atestado médico recomendando o afastamento.

Vale destacar que o empregador deve se acautelar para não praticar discriminação no ambiente de trabalho, encaminhando apenas os casos realmente suspeitos ao INSS ou ao médico do trabalho.

Orientações gerais

Apesar das incertezas e apreensões provocadas pelo novo coronavírus, o Sidncomércio acredita que o momento exige cautela, devendo todos estarem atentos aos desdobramentos e impactos da disseminação do vírus. É função social das empresas se acautelarem no sentido de conter a pandemia, praticando atos que evitem o contágio e a proliferação do vírus, primando pela manutenção dos empregos e da empresa.

A adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador é responsabilidade da empresa. Contudo, a preocupação, os cuidados e as medidas de enfrentamento são dever de todos, e não devem se restringir à higiene e medicina do trabalho, revestindo-se também de solidariedade e colaboração com a coletividade e o interesse público, sempre pautados pelo princípio da razoabilidade e preponderância do coletivo sobre o individual.

Nesse sentido, o empregado que eventualmente se recusar a, por exemplo, utilizar luvas, máscara respiratória ou álcool gel, ou que se negar ao isolamento quando recomendado, poderá ser punido com advertência, suspensão ou até mesmo justa causa. De igual modo, o empregador que não adotar medidas preventivas e de contenção pode estar praticando justa causa, de modo a ensejar a rescisão indireta daqueles empregados que se sentirem diretamente prejudicados, devendo, em ambas situações, ser avaliado o caso concreto.

A responsabilidade subjetiva do empregador pode ser afastada mediante a adoção de medidas de precaução, que devem ser documentadas com vistas a evitar futuras alegações de responsabilidade patronal por eventual contágio. Sob esse aspecto, imperioso lembrar que não é apenas o ambiente de trabalho que coloca em risco a saúde do trabalhador, mas também a utilização do transporte público no trajeto casa-trabalho-casa.

É verdade que não cabe ao empregador intervir na vida particular do empregado, impedindo-o de praticar atividades particulares, de comparecer a locais públicos com aglomeração de pessoas, ou de realizar viagens, sejam nacionais ou internacionais. Contudo, em se tratando de compromissos profissionais, sugere-se o reagendamento do que não for urgente, assim como o cancelamento de feiras, congressos, palestras e reuniões. Enfim, de todo e qualquer ato que coloque em risco o trabalhador.

 
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